segunda-feira, 13 de dezembro de 2010

JOGOS DE ARMAR

JOGOS DE ARMAR


Como você conseguiu fazer isso?
Elas sempre me perguntavam isso e eu nunca respondia. Perguntem-se pelo azul do céu. Por que o cinza das nuvens interrompe a cor para nos trazer a chuva, tornando a grama mais verde. Os homens deveriam aproveitar esse momento deitar-se na grama e receber a chuva tornando-se mais verdes e viçosos. No entanto eles abrem guarda-chuvas ou se abrigam, um despautério. Perguntem-se como os lutadores devem agir diante do adversário. Os que são melhores na defesa esperam o golpe, esquivam-se e partem para o contra-ataque fatal ou os que são melhores no ataque, desferem seus golpes certeiros, apesar de saber do contragolpe e treinam o suficiente para absorvê-lo. Os lutadores agem conforme o adversário e administram a luta conforme as necessidades do embate. Então me perguntam como consegui fazer isso e eu jamais responderei.
Gostaria que você tomasse cuidado comigo, ainda sou virgem.
Eu ia responder dizendo que era de capricórnio para tornar o ambiente mais ameno, mas eu não queria isso, queria o ambiente pesado, tenso, teso. Respondi perguntando por que eu deveria ter cuidado com ela. As pessoas querem que tenhamos cuidado com elas, cuidado em qual sentido? Pergunto-me. Cuidado pelo o que elas podem fazer conosco ou pelo que podemos fazer por elas? Que cuidado é esse? Até que ponto somos responsáveis pelo outro? Uma mãe gera uma criança no seu ventre e depois que a expele precisa tomar conta daquele corpo pelo resto da vida, tomar conta do corpo e dos anexos, seus desejos, vontades, necessidades e tudo o mais que compõe o que chamam de ser humano. Essa responsabilidade é contraditoriamente desumana. Você cria a necessidade de disponibilizar o seu corpo mutuamente com o outro que escolheu pra viver o resto da vida. Por que preciso tomar cuidado com o outro? Devo tomar cuidado comigo mesmo, não sei o que vou pensar daqui a alguns minutos. Quero dizer que sei muito bem o que vou fazer, mas ainda não sei o que vou pensar. Pensar e fazer não estão diretamente relacionados.
Você quer fazer como? Perguntei. Ela afastou um pouco a cortina, observou o jardim. Voltou-se em direção a cama depositando a bolsa sobre o criado-mudo. Voltou para a janela abriu novamente a cortina.
Ainda não sei. Respondeu finalmente.
Quem diz que não sabe o que quer sabe pelo menos muito bem o que quer dizer com isso. Quer que o outro saiba por ela e tome os direcionamentos necessários para realizar o que de fato ela quer. Principalmente na situação em que estávamos. Eu estava encostado na porta, virei a chave e guardei no bolso da calça sem que ela percebesse. Desabotoei a camisa lentamente. Aquela conversa não estava me excitando, se demorasse muito talvez me desse até enjôo.
Então vai ficar por minha conta? Perguntei já tirando a camisa e pendurando no cabide. Ela voltou-se e viu o meu peito. Notei seu ar de espanto. Fiz de propósito, isso sempre funcionava. Sentou-se na cama e não tirou mais os olhos de mim. Isso sim começou a me excitar.
Inacreditável. Ela disse sorrindo passando as mãos nos cabelos. Sinal visível de nervosismo.
As pessoas acreditam em coisas que nunca viram. Outras elas vêem e repetem aquela frase ridícula do inacreditável. Está ali na sua frente e elas dizem que não conseguem acreditar. No entanto nunca viram Deus e acham que ele tá lá em cima tomando conta disso aqui. Isso sim pra mim é inacreditável. Quando faço uma coisa faço bem feita, procuro o máximo de perfeição. Não deixo margem para questionamentos de quem quer que seja principalmente a própria coisa feita se questionar. Imagine eu criar o homem e plantar nele a sementinha do livre arbítrio, um cara com os atributos de Deus jamais faria uma burrice dessas. A mistificação da estupidez. Acredite no que você vê no que você toca. No que você sente é mais complicado. Como você vai saber se o que está sentindo é realmente o que está sentindo? Como descrever o amor ou o ódio? Você vai ter que recorrer a palavras e aí meu amigo, palavras certas para o lugar certo é o grande problema. E a palavra certa no lugar certo raramente encontra o leitor ideal. Ou o leitor ideal não está propenso a entender o que a palavra certa quer dizer. Você também pode recorrer a gestos para demonstrar o que está sentindo e vamos incorrer em situações mais complicadas. Um gesto de ódio vai gerar agressão, um gesto de amor um carinho, vamos fatalmente convergir para aquele papo da Física da ação que corresponde a uma reação de efeito contrário, mas sentimentos estão fora da Física, uma agressão pode gerar revide ou fuga, um carinho pode gerar outro ou fuga ou uma agressão, mais uma vez vamos depender do outro. Inacreditável é o outro.
Tirei os sapatos e as meias e joguei ao lado. Comecei a desabotoar e fui caminhando em direção à cama. Fiquei de costas e desci a calça lentamente. Eu nunca usei cuecas. O maravilhoso traseiro se apresentou aos seus olhos. Observei pelo espelho a sua reação. Joguei a calça longe. Mantive as pernas um pouco abertas.
E agora? O que faço? Perguntou ela. Ainda não sabia o que queria. Mas sabia o que eu deveria fazer considerando tudo que ela falou. Quase nada. Mas suficiente para as minhas conclusões. Virei lentamente. Apresentei meu sexo quase colado ao seu rosto.
Mas como isso é possível?
Algumas pessoas passam a vida toda fazendo perguntas. Algumas elas sabem que não existem respostas. Perguntam para provocar o espanto no outro. Algumas perguntas têm respostas, mas elas não têm coragem de procurar e esperam que o outro passe por essa situação de mostrar que a resposta era aquela ou no meio do caminho desviar e dar quase a resposta correta ou desviar e desembocar no maravilhoso mundo da mentira da fantasia e da viagem por caminhos que só as perguntas podem nos levar. Aquela pessoa não fez outra coisa além de perguntar. Eu não tinha as respostas que ela queria. Ela estava nervosa. Não sei exatamente o que falaram a meu respeito, mas eu não faria com ela o que fiz com as outras. Eu nunca repito o que faço. Se ela está esperando as coisas que eu fiz com a amiga que me indicou está muito enganada. A pista para os meus procedimentos ela deu. Era virgem. Queria que eu tomasse cuidado com ela. Isso significa que não devo tomar cuidado algum e que ela quer ser estuprada e é isso que ela vai ter.
O que falaram a meu respeito? Perguntei talvez por curiosidade talvez para que ela dissesse alguma coisa diferente de uma pergunta.
Falaram que você é terrível. Que é um cara violento. Que é um fenômeno da natureza, um incrível fenômeno da natureza. Está aqui bem na minha frente esse corpo másculo maravilhoso, essas pernas, coxas, barriga, braços, peito e essa incrível e inesperada buceta no meio das pernas. Eu me pergunto como você conseguiu fazer isso?
Sempre a pergunta. Peguei sua mão direita e dirigi em direção à minha gigantesca buceta depilada, ela sentiu o clitóris se expandindo como a língua do céu se desenrola. Lento e azulado. Dei um passo para trás e desferi o soco na ponta do queixo o suficiente para que ela desmaiasse. Perfeito. Era o tipo que não se deixaria amarrar livremente. Presos os braços e as pernas, tirei suas roupas e esperei que ela acordasse. A mordaça impediria aquelas malditas perguntas.
Ver aquele corpo inerte e à mercê me fez lembrar de coisas que eu pensava ter esquecido e que vieram junto com um sentimento que não consigo descrever. Lembranças da vida toda que, dizem, sempre acontece antes de alguém morrer, mas eu não estava morrendo, ao contrário, estava com uma vida em minhas mãos e poderia dispô-la do jeito que eu bem entendesse. Divago. O assassinato não faz parte do contrato. O que ela me ofereceu para trabalhar foi a preservação de uma virgindade e a impossibilidade de machucá-la. Abro a maleta. Bisturis, afastadores, serras, martelo, chaves de fenda, facas, pênis siliconado de vinte e cinco centímetros, outro de vinte centímetros, lubrificantes, outros pequenos utensílios que não vale a pena mencionar aqui. Sinto a falta de alguma coisa, depois vou me lembrar. Retiro o pênis de vinte e cinco centímetros, encaixo no cinto e amarro na cintura. Ela está demorando muito a acordar. Talvez estivesse cansada. Lembrei dos gerânios no jardim, precisam de luz e de duas a três regas por semana, cuidados para não borrifar as folhas, gostam de ambientes secos, evitar empoçar água para não prejudicar a raiz. Gosto de gerânios, de azaléias, de gardênias, gosto da maioria das flores. Ninguém precisa ensinar uma flor a voltar, elas voltam sozinhas. Lembrei do que estava faltando na maleta, o gerânio seco que guardo num dos bolsos laterais, vou colher outro e substituir. Ela ainda não acordou, vou fazê-la cheirar amoníaco. Mesmo quando podamos uma flor, ela não precisa que ninguém a ensine a voltar, ela sabe voltar, o mesmo não acontece com os humanos, precisamos tomar muito cuidado na hora do corte, sangue não sabe voltar.

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